terça-feira, 24 de agosto de 2010

A importância

Carnaval e educação: a importância do Instituto do Carnaval  

Por Bruno Filippo - Coordenador Geral do Instituto do Carnaval

Estudiosos do carnaval costumam aventar hipóteses para o surgimento da expressão “escola de samba”. Nisso há controvérsia, sobretudo porque, nas décadas de 20 e 30, época do surgimento do samba e das escolas, o registro daquele momento histórico era precário. Restringia-se às reportagens publicadas pela imprensa escrita - que, fragmentárias, dificilmente conseguiam captar a transformação por que estava passando o carnaval carioca - e às poucas atas escritas pelos componentes mais zelosos, muitas das quais se perderam com o tempo. Daí a importância da história oral, dos depoimentos dos velhos sambistas, para a preservação da memória do samba.

A entrevista de Ismael Silva a Sérgio Cabral em 1974, reproduzida nos dois livros que o jornalista e escritor dedicou ao assunto (“As escolas de samba – o quê, quem, quando, onde, como e por quê” e  “As escolas de samba do Rio de Janeiro”), é um registro que ficará para a posteridade. Cabral, perguntou-lhe quem sugeriu o nome escola de samba. Ao que Ismael respondeu: “Fui eu”. É capaz de você encontrar quem diga o contrário. Mas fui eu, por causa da escola normal que havia no Estácio. A gente falava assim: “É daqui que saem os professores.” Havia aquela disputa com Mangueira, Osvaldo Cruz, Salgueiro, cada um querendo ser melhor. E o pessoal  do Estácio dizia: “Deixa Falar, é daqui que saem os professores.’ Daí é que veio a idéia de dar o nome de escola de samba.”

A versão de Ismael, talvez, seja a mais conhecida, porém não é a única. O radialista, compositor e cronista Almirante afirmava que a expressão surgira da frase “Escola, sentido!”, entoada no tiro-de-guerra e popularizada após a Primeira Guerra Mundial. É fato que, antes da primeira escola de samba, o rancho Ameno Resedá, o mais importante da história do carnaval carioca, era conhecido como rancho-escola.    

Uma outra versão não contraria totalmente o depoimento de Ismael, apenas lhe acrescenta um detalhe curioso – o de que os jovens compositores do Estácio, que estavam revolucionando a música brasileira ao tornar o samba mais dolente e com notas mais longas, consideravam-se professores, mestres do novo estilo. Por isso, resolveram batizar a “Deixa Falar”, em 1928, como escola de samba. A escola do samba que eles produziam.      

O problema da história oral é simples: por melhor que seja a memória do depoente, sempre estará sujeita a lapsos. Mas, seja qual for a versão correta – não é absurdo imaginar que todas sejam verdadeiras -, a de Ismael, que associa a expressão à presença da escola normal do bairro, é mais interessante para o assunto relativo ao Instituto do Carnaval. Porque, simbolicamente, revela a proximidade do samba e do carnaval com a educação, ainda que, a princípio, fosse um estratagema dos sambistas para minorar o preconceito racial e social de que eram vítimas, tornando-os mais “palatáveis” ante a opinião pública.  A palavra escola teria o poder de conferir respeitabilidade às agremiações. (Antítese do que escreveria, poucos anos depois, o gênio Noel Rosa, em Feitio de Oração: “Batuque é um privilégio/Ninguém aprende samba no colégio”). A proximidade persiste, e não é uma questão apenas de nomenclatura.                

Talvez pareça difícil aos neófitos vislumbrar a função educativa das escolas de samba, por estarem associadas, no imaginário coletivo, à bagunça, à festa, à bebedeira, à carnavalização; mas, em quase oito décadas de existência, seus enredos, as letras de seus sambas, suas fantasias e suas alegorias exaltaram fatos e personagens importantes, massificaram histórias oficiais e subversivas, e tiraram do limbo figuras importantes e desconhecidas da maioria do povo brasileiro. A educação está presente, também, nas agremiações que realizam trabalhos sociais em suas quadras, oferecendo cursos, serviços médicos, esportes e creche.

Pode-se ver a relação entre educação e escola de samba não só pelo potencial do carnaval para levar conhecimento e fortalecer a cidadania – mas pelo interesse das instituições tradicionais do saber em  compreendê-la, em analisá-la, em reconhecer sua importância, em contribuir com sua melhoria, estabelecendo, assim, uma relação recíproca.

A intelectualidade brasileira ainda não reconheceu no samba e no carnaval a importância que ambos têm para a nossa identidade. Considera-os menor, um assunto pouco sério, desimportante quando se trata de tentar compreender o Brasil. Esse desprezo - resquício da influência marxista, em que a análise dos assuntos políticos e econômicos é predominante - é pitoresco, já que somos o país do samba e do carnaval (e do futebol, também, pouco valorizado pelos intelectuais). Trata-se de um estereótipo reducionista, sem dúvida, uma construção histórica e ideológica, mas isso é parte do problema, porque, de fato, o carnaval e o samba, assim como o futebol, são manifestações em que muitos dos nossos dilemas estão retratados.

Nos anos 70, três cientistas sociais, investigando, à luz das teses antropológicas e sociológicas, o carnaval e as escolas de samba, escreveram obras pioneiras, referências em quase todos os trabalhos posteriores: O Palácio do Samba, de Maria Júlia Goldwasser (1975); Escola de samba, ritual e sociedade, de José Sávio Leopoldi (1978); e, ambas de Roberto DaMatta, O carnaval como rito de passagem (1973) e Carnavais, malandros e heróis (1979). Este último livro é um dos grandes clássicos das ciências humanas brasileiras. Atualmente, as universidades e os centros de pesquisa, mostram-se mais interessados no assunto. O número de livros, monografias e teses acadêmicas aumentou de maneira considerável. Algumas universidades criaram núcleos específicos de estudo do carnaval. Até economistas têm destrinchado a importância da festa para a economia do país.

Em outubro de 2005, um novo capítulo dessa relação foi escrito, com o surgimento do Instituto do Carnaval. Realização da idéia que o médico e historiador Hiram Araújo acalentava há trinta anos, o Instituto oferece, entre outras atividades, o primeiro curso superior de carnaval do mundo, e vem ao encontro da tendência irreversível de profissionalização da festa.

O Instituto do Carnaval, tal qual a Deixa Falar, carrega um enorme simbolismo, tão grande que somente aos poucos está sendo percebido. Quando uma universidade cria um curso, qualquer curso, não está apenas lhe reconhecendo o papel relevante na sociedade - está institucionalizando-o, pondo-o no patamar de um saber, de uma ciência. É nesse patamar que hoje está o carnaval, setenta e sete anos depois da criação da primeira escola de samba.

Nossa História.

A história do Estudo do Carnaval na Universidade: O sonho que virou realidade!

Hiram Araújo - Diretor do Instituto do Carnaval

“De minhas oito décadas de vida, dediquei quase cinco ao estudo do carnaval. Mas foi somente há pouco mais de cinco anos, em outubro de 2005, que me senti plenamente realizado profissional e pessoalmente – e o Instituto do Carnaval foi quem me proporcionou esse momento de consagração, ao criar o primeiro curso superior de carnaval do Brasil, um sonho que acalentava e pelo qual lutava havia trinta anos.

Nos livros e em artigos que tenho escrito ao longo de minha carreira como pesquisador, enfatizo que a universidade sempre foi preconceituosa com o estudo do carnaval, por isso não formamos uma teoria capaz de interpretar corretamente o carnaval carioca. Em conseqüência, perdemos 22 preciosos anos na libertação econômica do carnaval carioca.

O sambódromo deveria ter sido construído em 1963 e não em 1984, tempo esse da maior descapitalização da festa pela indústria do monta e desmonta (construção das arquibancadas tubulares móveis).

Uma vez o antropólogo Gilberto Velho disse: “estou absolutamente convencido que a universidade tem papel fundamental na vida social. Não é uma coisa anacrônica, é um espaço, em princípio mais isento, mais crítico que pode fazer uma reflexão mais independente. Esta reflexão é o grande patrimônio da universidade. A universidade é fundamental para a idéia de uma sociedade moderna. Ela é o espaço onde as idéias podem circular com um pouco mais de distanciamento em relação a interesses imediatos”.

A ausência do estudo do carnaval na universidade e o não engajamento de nossos intelectuais na direção da empresa carnaval, instalada na cidade do Rio de Janeiro a partir de 1933, quando o Poder Público, tornou-se empresário da festa, levou nossa INTELLIGENTSIA a uma visão equivocada da nova realidade do carnaval carioca, em processo de evolução na Cidade do Rio de Janeiro.
O emprego da verba pública para salvar o moribundo carnaval, que havia perdido suas bases de sustentações econômicas espontâneas das comunidades do centro que foram expulsas para as periferias da cidade (os ricos foram para a zona sul e os pobres para os morros e subúrbios) pela reforma Pereira Passos no início do século XX, condicionou um novo estilo de carnaval, modelo de indústria cultural que exigiu a criação de uma empresa para movimentar o novo mercado do carnaval carioca.

Ao assumir o ‘status’ de empresário, o Poder Público o fez amadoramente, não tirando do mercado as bases econômicas de sua sustentação. Paralelamente, o surgimento de uma indústria subsidiária, começou a viver parasitariamente do mercado do carnaval.

À medida que o carnaval carioca, modelo Indústria Cultural, mais progredia, o empresário Poder Público mais empobrecia e a indústria subsidiária predatória mais enriquecia.

Enquanto na Alemanha Johann Wolgang von Goethe, escritor, poeta e conselheiro econômico e político da Weimar, autor, entre outras obras, do Fausto, foi o organizador oficial dos Folguedos e Mascaradas da Corte, entre nós, nenhum intelectual esteve à frente da empresa carnaval carioca.

Sem a vivência da prática, que Maffesoli chama de “respiração social”, nossa INTELLIGENTSIA passou a interpretar o carnaval com olhar saudosista, dizendo que o carnaval é uma festa popular que não deve gerar lucros. Essa alienação da realidade justificou a conduta amadora na condução da Empresa-Carnaval carioca que tanto atraso trouxe.

Segundo estudos conduzidos pelo economista Luiz Carlos Prestes Filho no livro “A cadeia produtiva do carnaval carioca”, o carnaval do Rio de Janeiro movimenta cerca de R$700 milhões de reais por ano em nossa cidade, e gera milhares de empregos diretos e indiretos. “

Por isso, o Instituto do Carnaval, quando passou a oferecer o primeiro curso superior de carnaval do Brasil, e com isso elevando a formação de profissionais para o seu processo produtivo, não somente cumpriu seu papel institucional de formadora de conhecimento, mas se pôs na vanguarda do progresso cultural e econômico.

Cursos - Cobertura Jornalística do carnaval

COBERTURA JORNALÍSTICA DO CARNAVAL - INSTITUTO DO CARNAVAL E FACULDADES INTERADAS HÉLIO ALONSO (FACHA)


OBJETIVO:
Capacitar jornalistas, estudantes de jornalismo e interessados no assunto para trabalhar em coberturas de carnaval.


PROFESSORES:

BRUNO FILIPPO: Coordenador geral e professor do Instituto do Carnaval, pioneiro no ensino superior de carnaval e gestão do carnaval. Jornalista formado pela FACHA e sociólogo pela UFRJ, mantém uma coluna de ensaios sobre carnaval, samba e música popular no site do jornal “O Dia”.

VICENTE DATTOLI: Jornalista, pesquisador, professor do Instituto do Carnaval, assessor de imprensa da Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro. Participou de cobertura de carnaval pelos jornais “Última Hora”, “Jornal do Brasil” e “O Dia” e pela “TV Globo”.


CARGA HORÁRIA:
32h (6 aulas + trabalhos + visitas técnicas)
HORÁRIO:
9:00 às 13:00h
DIA DA SEMANA:
6 SÁBADOS

INÍCIO:
2º semestre - a confirmar

LOCAL DO CURSO:
Rua Muniz Barreto 51 – Botafogo – Campus I da FACHA

INVESTIMENTO:

R$ 300,00 ou 2 x R$ 150,00 ou R$ 240,00 ou 2 x R$ 120,00 (alunos FACHA)

TURMAS:
Publicar postagem
MÁXIMO: 35  MÍNIMO: 15
PÚBLICO ALVO:
Profissionais de diversas áreas que tenham interesse na linguagem audiovisual com cunho documental.

INSCRIÇÃO
www.facha.edu.br

CONTEÚDO BÁSICO:

UNIDADE 1 – FUNDAMENTOS BÁSICOS
Estética do Carnaval
Linguagem carnavalesca
Evolução
Expansão
A maior festa do planeta
A importância do carnaval do Rio em outras cidades

Os quesitos
Os critérios de julgamento
A subjetividade de julgamento
As comissões de obrigatoriedade

UNIDADE 2 – JORNAL, RÁDIO, TV, INTERNET, ASSESSORIA

Os cronistas carnavalescos
Pré-Carnaval
O desfile
O fenômeno dos blocos
Programas e apresentadores
TV: Exclusividade, pool ou livre competição?
A importância da comunicação
Do divulgador ao assessor
Atividade sazonal ou trabalho para o ano inteiro?
Atividades práticas

Nossas Atividades.

Curso Superior de Carnaval - Parceria com instituições de ensino superior para implantação e manutenção de curso superior de carnaval.

Palestras e Seminários - Profissionais gabaritados discorrem sobre temas relacionados ao carnaval e à cultura brasileira.

Consultoria e Assessoria  - Gestão de eventos e festas carnavalescas para empresas dos setores públicos e privados

Consultoria e Assessoria Jurídica relacionadas ao Carnaval - Suporte jurídico na contratação e legalização para participação no evento.

Formação de Jurados - Capacitação de profissionais para atuar como julgadores de escolas de samba e blocos.

Oficinas de artes carnavalescas - Aulas práticas de técnicas utilizadas em confecções de alegoria, fantasia e adereço de carnaval.

Oficinas de percussão - Formação de percussionistas para bateria de escola de samba, blocos e demais atividades carnavalescas.

Direção de Carnaval - Formação de diretores de carnaval para as escolas de samba.

Pesquisa e Desenvolvimento de Enredo - Confecção de sinopse embasada em sólida pesquisa de enredo.

Hélio Turco, o Mestre - Patrícia Raposo

 É em casa simples e familiar em Mangueira que mora um dos maiores compositores da história da Estação Primeira.

                                    
Maior campeão de sambas-enredo na escola, com dezesseis composições, Hélio Rodrigues Neves teve suas estrofes de métricas perfeitas incluídas em inúmeras questões de vestibular. Ficou popularmente conhecido como Hélio Turco. O apelido se deu quando ganhou de seu tio, Jorge Turco, o armarinho do qual era dono. Nascido no Grajaú, mudou-se para Mangueira aos seis meses de idade. Artesão de mão cheia, Hélio confeccionava balões e pipas. E fala com orgulho das suas obras como artesão: “Eu sempre fiz muito balão e a rapaziada aqui sempre gostou muito. As crianças ficavam maluquinhas. Na época dessas festas juninas eu vinha aqui pra fora e ficava do portão só colocando os balões pro alto, era uma farra.”
Sobre sua vida familiar, conta que namorou por dez anos Dona Dalva, com quem fará 50 anos de casado no final deste ano. Juntos, têm três filhos e três netos. Todos moram na pequena vila próxima à quadra da Verde e Rosa.  “Aqui em casa entra de tudo. Vem amigo, vem compositor, vem sambista, deputado, bêbado, passista, criança e até a malandragem. Minha porta fica aberta. Só depois de 30 anos de casado resolvi fazer aqui uma obra danada e descobri que a porta da casa tinha chave. Chave pra quê? Eu moro no lugar mais seguro do Rio de Janeiro. Aqui não tem nada. Não tem assalto, não tem perigo, todo mundo se conhece, todo mundo é amigo.”
Foi servir ao exército, porém não se adaptou à vida militar. Ficou lá apenas um ano, três meses e quinze dias:  “Eu não sei receber ordem...ah! não dá não. Se você me pedir alguma coisa faço com o maior prazer, faço tudo, me pedindo direito eu tiro até minha roupa do corpo para dar, mas não venha me dar ordem, falar  mais grosso, com autoridade comigo que não consegue nada. Eu vivia preso no exército. Não usava farda, não seguia nada. Saía do batalhão e voltava por aqui andando pela linha do trem!”
 Relata ainda que sua história na Mangueira começou de forma inusitada no ano de 1957. Tinha um amigo que fazia colchões de mola chamado Jorge Pelado. Uma tia de Hélio, que morava na Rua Uruguai, no bairro da Tijuca, pediu-lhe que levasse o amigo até lá para que ela fizesse uma encomenda. Turco, então, foi até a casa do amigo para chamá-lo, mas lhe disseram que Jorge estava na quadra da escola de samba. Hélio Turco seguiu para a quadra da Mangueira, onde acontecia uma reunião: “Eu cheguei na hora da reunião e o Beleléu falou:  -Vamos fazer uma diretoria agora. A Ala dos Compositores e eu queremos uma diretoria. Eu fiquei de fora debruçado na janela só olhando... Estava uma confusão danada. Foi chegando gente, chegando gente, mas não formava o número de gente que precisava. Estavam também Jurandir e Nelson Sargento... estavam tentando colocar ordem naquela bagunça. O Carlos Cachaça e o Cartola não deram muita atenção e se retiraram. O Pelado se virou e falou:  -Coloca o Hélio!
Hélio prossegue, divertindo-se muito. “Eu não sambava, não cantava, não tocava. Mas para ajudar meus amigos a segurarem aquele compromisso, assumi. Entrei como secretário em 1956 e fiquei por 15 anos na tesouraria da escola
Começava, assim, uma longa história de amor entre o futuro compositor e a Estação Primeira de Mangueira. No ano de 1958 escreveu seu primeiro samba. Ele fez a letra e o amigo Pelado a musicou. Chamava-se “Decaída”. Em 1959, seu samba “Brasil através dos tempos”, parceria com Pelado e Cícero, levou a Mangueira ao terceiro lugar. Em 1960, com “Carnaval de todos os tempos” novamente com Pelado e Cícero, a Mangueira consagrou-se campeã. Em 1961, compôs “Recordações do Rio Antigo” e a Mangueira foi bicampeã.
No ano seguinte ele perdeu a disputa, mas voltou a vencer nos três anos seguintes: em 1963 com “Exaltação à Bahia”, 1964 com “História de um Preto Velho” e em 1965 com o samba “Rio através dos séculos”. Entre 1967 e 1969 e em 1971, Hélio Turco continuou apresentando sambas campeões. “O Mundo Encantado de Monteiro Lobato” de 1967, consagrou a Mangueira Bicampeã, e, em 1968 venceu novamente com “Samba, Festa de um Povo”, tendo parceria com de Darcy, Batista e Dico. Em 1969, de uma parceria com Darcy e Jurandir surgiu a letra “Mercadores e suas Tradições”, por fim, em 1971 compôs “Modernos Bandeirantes” mais uma vez com Darcy e Jurandir.
Após esse ano, Hélio, sempre muito envolvido com a escola presenciou e constatou erros e arbitrariedades na Estação Primeira, e, por isso foi prestar conta com os responsáveis. Após desgastes e algumas imposições que estavam sendo feitas à ala dos compositores, ele foi afastado. Contam que ele se afastou, porém, ele relata que o suspenderam por 10 anos: “Eu estava aqui na sala quando entrou uma menininha por essa porta falando que eu estava suspenso da Mangueira. Eu não fiquei com raiva não, sabia? Senti pena, muita pena deles.
Reencontrou-se com a Mangueira e, especificamente, com o samba-enredo em 1984, com o histórico “Yes, nós temos Braguinha”, que deu o título à escola no primeiro ano de desfile realizado no Sambódromo. Hélio Turco relembra que há seis anos a Mangueira passou a ser um órgão federal. Sendo assim, conseguiu mais patrocinadores; e ajudar sua escola de coração retirou os processos que havia colocado na justiça. Pessoas entravam na Presidência, e ele via os mesmos erros e absurdos se repetindo. Sempre lutando pela dignidade da escola e colocando o respeito acima de tudo, continuava batendo de frente e defendendo suas idéias. No ano de 2005, após passar sua suspensão, ele escreveu um samba no qual cantava no refrão “(...) voltei, fui buscar inspiração e quando o samba me chama eu vou...” Criticaram-no dizendo que estava falando sobre sua própria história, falando de sua “volta” para escola e com isso foi recusado. Hélio enfatiza que, hoje em dia, a escolha do samba é feita por uma imposição de forças maiores e interesses: “  uma pena que tudo esteja assim, principalmente hoje em dia. O dinheiro está acima de tudo e de todo mundo. É uma vergonha. A Mangueira não precisa disso.”
Sobre o samba de 2011, cujo enredo falará sobre Nelson Cavaquinho, e ele relembra dos momentos que viveu com o homenageado: “ O Nelson era uma pessoa maravilhosa. Sempre almoçava comigo às terças-feiras. Eu era gerente de uma loja em Piedade e saía de bicicleta pra encontrar com ele no bar da esquina. Ele gostava muito de nadar sozinho por aí. Saía de casa todo dia primeiro de cada mês e retornava no dia primeiro também ... mas no dia primeiro do mês seguinte! Em seguida, mostra com exclusividade o samba que compôs para participar da disputa de samba-enredo para  o carnaval de 2011.
Apesar do desgaste provocado pela sua suspensão, Hélio Turco continua com força dentro da escola. Um exemplo de sua força dentro da escola é que, em maio, foi convidado pelo atual Presidente da Mangueira Ivo Meirelles, para ser Presidente de Honra da Ala dos Compositores. Ele finaliza a entrevista, que teve a leveza de uma deliciosa conversa e que durou uma tarde inteira, dizendo com lágrimas nos olhos:
Eu tenho saudades do meu amigo Jurandir. Juntos fazíamos o que se chama de polimento do samba. A gente ouvia as pastoras e ia acertando os trechos onde elas tinham dificuldades para cantar. O samba era assim, feito com alma. Carnaval precisa de leveza e alegria.  A Mangueira é um touro que não sabe usar a força que tem.



Sambas-enredo de Hélio Turco para a Mangueira

Brasil através dos Tempos de 1959
(Hélio Turco, Pelado e Cícero)

Carnaval de Todos os Tempos de 1960
(Hélio Turco, Pelado e Cícero)

Recordações do Rio Antigo de 1961
(Hélio Turco, Pelado e Cícero)

Exaltação à Bahia de 1963
(Hélio Turco, Pelado e Comprido)

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Sady Bianchin - Cultura, Conciência e Transformação

 Qual o valor de uma visão? Uma vez li um verso do poeta Mário Quintana que dizia: “sonhar é acordar-se para dentro”. Ele me fez notar que por trás da maioria das grandes realizações, das obras dignas de registro, estão visões de mundo fortes o suficiente para impulsionar a prática. Costumo dizer que nós somos do tamanho dos nossos sonhos. O sonho por um país e uma cidade melhores coloca-nos diante de um olhar desafiador na direção de um futuro mais digno para nossa população. Neste contexto, entra em cena a cultura, elemento integrador de um povo. Esta produção de sentidos deve estar permanentemente em pauta por meio de políticas públicas. Temos de utilizar seu potencial de unificação da identidade e de geração de economia.
A cultura democrática é uma estratégia para conquistar a credibilidade das sociedades.  É uma fonte de revigoração das expectativas da autoestima. Uma cidade será mais igualitária quanto mais bem distribuído for o acesso à cultura. Não basta o estado ordenar a construção simbólica e o patrimônio histórico, mas sim elaborar políticas públicas com fim de orientar o desenvolvimento da produção do imaginário social com o objetivo de transformação da realidade. O pensador Antonio Gramsci falava em cultura hegemônica e subalterna, ensinando-nos que a cultura só é subalterna enquanto as classes populares não tiverem consciência de si. A Constituição de 1988 garante a todos o pleno exercício dos direitos culturais. Portanto é compromisso do estado a valorização e difusão das manifestações no âmbito cultural. Não o modelo de cultura para todos, e sim cultura por todos, para encurtar a distância entre as diferenças sociais. O caminho é o respeito à diversidade para a construção de um diálogo intercultural para solucionar conflitos no espaço público. A Declaração dos Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) afirma: “toda pessoa tem o direito de integrar livremente a vida cultural da comunidade”.
As cidades têm passado, presente e futuro. Nelas falam o humano, o sensível, a fantasia, as ideias que representam as pessoas e grupos sociais. No Brasil, com que conceito de cultura nós estamos trabalhando? Que tipo de orientação temos do poder público? As tomadas de decisões em políticas culturais chegam à população? Os espaços existentes funcionam ativamente ao alcance da coletividade? Há projetos de geração de renda para a classe artística? São algumas perguntas de projeção nacional, já que políticas públicas pressupõem um conjunto de ações coletivas voltadas para as garantias dos direitos sociais. Para tanto, é essencial uma política cultural que revitalize o comportamento dos moradores e suas tradições. O papel do estado não pode ser substituído pelo setor privado, mas deve atuar em parceria com ele, protegendo as expressões da cultura popular, único campo onde ainda não somos colônia. É essencial defender o saber local com investimento no território, descentralizar os processos decisórios e a disposição aos bens e serviços culturais. Pensar em políticas públicas para a cultura hoje é elaborar metas num programa interdisciplinar, numa relação com a educação, meio ambiente, turismo, comunicação social, ciência e tecnologia, saúde, esporte, segurança pública, entre outros. Também sob o ponto de vista econômico a cultura pode ser compreendida como um sistema de cadeias produtivas e avança na economia do conhecimento: nos setores financeiros, biotecnologia e computadores.
Dar dimensão do olhar para a cultura é inserir sua colaboração na busca constante por uma sociedade mais solidária, uma cidade menos desigual e com mais qualidade de vida. É possibilitar voz e visibilidade para os excluídos periféricos. A cultura é um fermento para um novo amanhã no cenário urbano, alicerçado na cidadania e na arte-educação. É preciso observar a cultura na sua dinâmica social, centralidade nos processos políticos. Assim, perceberemos que ela faz os jovens mais homens e os homens mais jovens.

Professor do Instituto do Carnaval, Sady Bianchin é poeta, ator, diretor de teatro, jornalista e sociólogo. Doutor em teatro e sociedade pela Universidade de Roma - Itália, mestre em ciência da arte pela UFF e professor universitário. Foi secretário de Cultura de Marica. Este texto é versão ligeiramente modificada do artigo homônimo publicado no jornal “O Fluminense”.